ANÁLISE DO POTENCIAL INIBITÓRIO DO ÁCIDO CLOROGÊNICO E DO ÁCIDO ROSMARÍNICO FRENTE AOS EFEITOS DA PEÇONHA DA SERPENTE Bothrops leucurus WAGLER (1824)
Atividade antiofídica; Compostos fenólicos; Bothrops leucurus; Neutralização de toxinas.
Os acidentes ofídicos representam um sério problema de saúde pública em países tropicais, tendo em vista o alto índice de ocorrências e a morbidade/mortalidade que ocasionam. A serpente Bothrops leucurus é uma das principais responsáveis pelos acidentes ofídicos notificados no Nordeste brasileiro, porém, esta espécie não está incluída no pool de peçonhas utilizado na produção do soro antiveneno brasileiro, o que pode comprometer a eficácia do tratamento clínico. Adicionalmente, o soro tem eficácia limitada em mitigar os efeitos locais do envenenamento, além de apresentar problemas na sua logística de distribuição e ocorrência de reações adversas. Neste contexto, diversos estudos tem sido realizados a fim de desenvolver tratamentos complementares para os efeitos do envenenamento, e as plantas medicinais tem se destacado neste campo, representando uma importante fonte de compostos com potencial para auxiliar no tratamento de envenenamentos. O ácido clorogênico e o ácido rosmarínico são moléculas derivadas do metabolismo secundário de plantas, apresentando ação antioxidante, anti-inflamatória e anticoagulante, mas o potencial antiofídico de ambos ainda é pouco explorado, apesar dos achados promissores na área. Assim, nosso objetivo foi avaliar o potencial inibitório de ambos os ácidos na toxicidade desencadeada pela peçonha da serpente B. leucurus e de uma das suas fosfolipase A2 isoladas. Inicialmente, foi avaliada a capacidade de neutralização in vitro dos principais componentes da peçonha, nas quais foram analisadas as atividades de fosfolipase A2, hialuronidase, proteolítica, fibrinogenolítica e coagulante. Em seguida, foram realizados testes in vivo para verificar a inibição dos ácidos frente aos efeitos locais da peçonha em camundongos, com ensaios de atividade hemorrágica, edematogênica, miotóxica, atividade de mieloperoxidase e produção de interleucinas. Adicionalmente, a inibição da toxicidade sistêmica da peçonha foi avaliada por meio da análise de diversos marcadores bioquímicos, hemostáticos e hematológicos, bem como foi verificado o grau de peroxidação lipídica nos tecidos renal e hepático. Os resultados demonstraram que ambos os ácidos foram eficazes em inibir in vitro as atividades enzimáticas da peçonha, sobretudo a atividade de hialuronidase. Nos ensaios in vivo, os inibidores demonstraram neutralização significativa do edema, com diminuição da atividade da mieloperoxidase e da expressão de interleucinas. Os inibidores também atenuaram expressivamente as ações hemorrágica e miotóxica da peçonha. Nos marcadores bioquímicos séricos, os ácidos rosmarinico e clorogênico atenuaram as alterações nos parâmetros avaliados e, adicionalmente, diminuíram o nível de peroxidação lipídica nos tecidos hepático e renal. No entanto, ao avaliar os parâmetros hemostáticos, apenas o ácido rosmarínico foi capaz de reduzir os efeitos sobre o fibrinogênio circulante e a contagem de plaquetas. Tomados em conjunto, os resultados obtidos evidenciaram o potencial antiofídico dos ácidos clorogênico e rosmarínico, que apresentaram, em geral, maior eficiência de inibição do que o soro antiofídico. Assim, ambos os inibidores são candidatos promissores ao desenvolvimento de futuros adjuvantes a serem usados para complementar a soroterapia disponível atualmente.