“EM POSSE DE UM SEGREDO QUE NÃO ERA MEU”: UMA ETNOGRAFIA ENTRE SILÊNCIOS E SEGREDOS EM TORNO DO VIVER COM HIV/AIDS EM CONTEXTO DESCENTRADO
HIV/aids; Silêncios e segredos; Cidade pequena; Etnografia em serviços de saúde; Experiência com a enfermidade.
Diante de processos sociais produzidos pelo estigma e discriminação em relação ao HIV/aids, as pessoas que vivem com esta condição, sob a lógica da longa duração, se veem diante de um processo de economia de visibilidade: adentram à um universo de silêncios e segredos como forma de proteção. Esta pesquisa parte do pressuposto que, diante das especificidades da dinâmica social dos contextos interioranos, o lugar de origem/moradia, enquanto marcador social da diferença, modela a forma como essas pessoas irão viver a soropositividade, de forma que empenham uma série de agenciamentos com vistas à proteção da identidade em um contexto de tendência de borramento entre os aspectos públicos e privados da vida. Diante disso, o objetivo deste estudo consistiu em compreender como é modelada, pensada, vivida e significada a experiência de viver com HIV/aids entre silêncios e segredos em contexto descentrado. A etnografia é o referencial teórico-metodológico adotado para apreensão do objeto de estudo. O campo foi realizado entre os meses de abril e setembro de 2019 em um serviço especializado situado no interior do Rio Grande do Norte. Durante as incursões em campo utilizou-se observação participante, produção de diários de campo e entrevista semiestruturada para a recolha das informações junto aos interlocutores. Esses dados foram interpretados com base na literatura socioantropológica sobre sofrimentos e adoecimentos de longa duração, silêncio e segredo e marcadores sociais da diferença. Da análise deste material foram produzidos dois capítulos. O primeiro, explora a prática etnográfica e a experiência de alteridade no momento em que a pesquisadora viveu um encontro em campo que lhe custou a posse de um segredo que não era seu, a partir do qual iniciou a problematização em torno dos silêncios e segredos em contextos interioranos. O segundo, dialoga com experiência vivida e narrada no capítulo anterior, quando o interlocutor protagonista do encontro passou a ser o narrador das questões que envolviam o agenciamento dos silêncios e segredos sobre a soropositividade na cidade pequena. Da discussão empreendida foi possível concluir que a vulnerabilidade do sigilo nos contextos interioranos perpassava pela dinâmica social da cidade pequena que traziam à tona a possibilidade da descoberta do segredo, fazendo com que a PVHA viva no silêncio do seu corpo uma identidade indizível.