FILME ACESSÍVEL: A AUDIODESCRIÇÃO COMO A RECRIAÇÃO DE UMA IMAGEM EM PALAVRAS.
Pessoas com deficiência visual. Tradução audiovisual acessível. Audiodescrição. Filme Acessível.
A audiodescrição é um gênero discursivo que consiste na tradução intersemiótica de imagens, ou seja, de um sistema de signos para outro, a fim de garantir a autonomia de pessoas com deficiência visual no processo de inclusão no mundo da vida e da cultura (ALVES, 2012, 2014; ALVES; TELES; PEREIRA, 2011, 2017; MOTTA; ROMEU FILHO, 2010). Dessa forma, este estudo, de cunho qualitativo-interpretativista, vinculado à Linguística Aplicada INdisciplinar (MOITA LOPES, 2006), compreende a audiodescrição de filmes como um recurso de acessibilidade para pessoas com deficiência visual, produzido por meio de signos verbais que se apoiam e se subordinam tematicamente a signos imagéticos. A pesquisa toma como objetos empíricos um roteiro e duas revisões feitas para ele, produzidos por três grupos de sujeitos: audiodescritores-roteiristas videntes, audiodescritores-consultores videntes e, por fim, audiodescritores-consultores não videntes. Para tanto, tem seu aporte em teóricos da semiótica da cultura, mais especificamente Bakhtin (2011, 2015, 2016, 2017), Medviédev (2012) e Volóchinov (2013, 2017), principais representantes dos estudos dialógicos da linguagem, para entender como se dá o processo de apropriação e transmissão do enunciado alheio. Além disso, busca suporte no filmólogo Sergei Eisenstein (2002a, 2002b), defendendo a noção de filme como um produto artístico construído dialogicamente, como uma manifestação das relações de interação entre sujeitos e, portanto, atravessadas por valor e posicionamentos ideológicos. A reunião das vozes desses sujeitos permitirá investigar as maneiras de apropriação e transmissão da voz alheia, na tradução intersemiótica de um vídeo para a linguagem verbal, por meio de um processo de audiodescrição, capaz de promover, na perspectiva da autonomia responsiva da pessoa com deficiência visual, seu acesso a recursos videográficos. Para tanto, será necessário compreender o processo de apropriação do tema/sentido predominante no material audiovisual pelos audiodescritores videntes e sua tradução em seus enunciados verbais; bem como comparar os posicionamentos dos audiodescritores videntes - tanto roteiristas como revisores - com o posicionamento dos audiodescritores-consultores não videntes, materializados nos enunciados concretos. Para que isso ocorra, lançamos mão da noção de sentido que o filme transmite, de valoração social e de olhar exotópico e das formas de transmissão da temática, por meio de recursos linguístico-discursivos, para pessoas com deficiência visual. Os resultados mostram que o processo de roteirização de uma audiodescrição se dá, majoritariamente, pela estilização do discurso alheio, uma vez que não exerce a função apenas de construir uma tradução, mas de recriar um enunciado que diálogo com as imagens, bem como com a intenção proposta pelo filme. Na audiodescrição, precisam ser exploradas, antes de mais nada, a sensibilidade do olhar e a criatividade discursiva do audiodescritor.