RESPONSABILIDADE ENUNCIATIVA NO GÊNERO JURÍDICO CONTESTAÇÃO
Análise textual dos discursos. Contestação. Discurso jurídico. Mediativo. Responsabilidade enunciativa. Ponto de vista
É na seara do discurso jurídico que dispomos dos mais diversos gêneros discursivos textuais, que podem ser tomados como objeto de análise na interface Linguagem e Direito. Dentre os gêneros que circulam no domínio em foco, elegemos investigar nesta tese o gênero jurídico contestação, no que concerne ao fenômeno da responsabilidade enunciativa (RE). Especificamente, propomo-nos a identificar, descrever, analisar e interpretar nas seções “Das preliminares” e “Do mérito”, que compreendem, respectivamente, a defesa no plano processual e material da contestação: i) os planos de texto e as sequências; ii) os pontos de vistas assumidos pelo locutor enunciador primeiro (L1/E1) e enunciadores segundos (e2); iii) as marcas linguísticas que apontam a assunção da responsabilidade enunciativa e/ou um quadro mediativo. A escolha do gênero jurídico contestação tem sua relevância por ser um gênero recorrente no processo civil e apresentar características próprias com exigências previstas na legislação, além de possuir caráter prático. Optamos pela análise das seções das preliminares e do mérito porque nessas partes estão o núcleo da narração e exposição dos argumentos, o uso de discurso citado e a entrada de outras vozes (requerente(s), doutrinadores, legisladores, juristas), possibilitando, assim, o estudo das marcas textuais reveladoras de responsabilidade enunciativa. Metodologicamente, a pesquisa é do tipo documental, de caráter qualitativo-interpretativista. O corpus é constituído por 10 (dez) peças jurídicas, escritas por diferentes advogados, contestações protocoladas no 2º Juizado Especial Cível da Zona Sul da Comarca de Natal-RN, no período de 2013 a 2014. Os textos/documentos analisados relacionam-se a temas referentes ao direito do consumidor. Nossa ancoragem teórica situa-se na abordagem da Análise Textual dos Discursos (ATD), enfoque desenvolvido por Adam (2011), que objetiva analisar a produção co(n)textual de sentido, fundamentada na análise de textos concretos. Essa perspectiva tem como bases teóricas a Linguística Textual (LT) e a Linguística Enunciativa. No que se refere ao ponto de vista (PDV), acompanhamos os estudos de Rabatel (2008, 2008a, 2009, 2015, 2015a) e para o quadro mediativo, seguimos Guentchéva (1994, 1996, 2011), uma vez que se constituem como noções basilares para o tratamento da responsabilidade enunciativa. Assim, além desses autores, também utilizamos Adam (2011), tanto no que diz respeito à responsabilidade enunciativa como no que concerne ao plano de texto e às sequências. Quanto ao discurso jurídico, focalizamos nos estudos de Rodrigues; Passeggi; Silva Neto (2014), Lourenço (2008, 2015), Pinto (2010), Gomes (2014), Tullio (2013), Palaia (2010), dentre outros. Selecionamos duas categorias de análise que, segundo Adam (2011), caracterizam na materialidade textual o grau de RE dos enunciados proposicionais: as modalidades, que são determinantes dos locutores, dos enunciadores e dos pontos de vista. Igualmente, a indicação de quadros mediadores, através de marcas linguísticas que apontam o quadro mediativo, ou seja, a não assunção da RE. A análise preliminar dos nossos dados de pesquisa demonstra que a contestação, enquanto gênero discursivo textual, pode exemplificar um plano de texto fixo, justificando-se por apresentar em sua estrutura composicional uma padronização e uma formalização, obedecendo à forma prescrita em lei, com predominância da sequência argumentativa, visto que, além de ser marca prototípica do discurso jurídico, o produtor do texto, ao assumir a RE e utilizar-se dos PDV de outros enunciadores, influencia e estabelece a orientação argumentativa do texto. No que se refere ao quadro mediativo, observamos que a entrada de fontes do direito funciona como estratégia do que é dito pelo locutor enunciador primeiro (L1/E1) para assinalar a não assunção da responsabilidade enunciativa.