A PRESENÇA DOS MITOS NOS LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Livro didático; cultura popular. mito
Este trabalho tem como objetivo geral analisar a presença dos "mitos", como marcas da "cultura popular" (e do folclore) em uma coleção didática de ensino de língua portuguesa bem avaliada pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Para tanto, orientamo-nos a partir dos objetivos específicos em destaque: a) catalogar os mitos presentes na coleção didática; b) comparar as diferentes versões ou a recorrência do mesmo mito nos LD, analisando o que nelas se preserva e o que é obliterado, quando comparado às recolhas do folclorista Câmara Cascudo (2000, 2001, 2002, 2006), nome reconhecido no estudo sobre a cultura popular; c) analisar quais gêneros textuais reativam os mitos nos LD ou se o "mito", enquanto texto, constitui, por si só, um gênero textual, ao lado, dos “contos etiológicos” ou “lendas”; d) analisar que tipo de trabalho com a linguagem (oralidade e escrita) a coleção didática privilegia ao manejar com o mito, seja como "conteúdo temático" ou “gênero textual”. Nossas análises iniciais demonstram que parece haver um conflito entre aquilo que é da ordem da oralidade e o que seria da "literatura oral" nos livros didáticos, objetos de nossa pesquisa. Do mesmo modo, o trabalho com textos cuja temática é, de modo geral, a cultura popular mantém uma forte relação com a leitura e “escuta”, estando aí o trabalho com a produção textual negligenciado. Embora a escrita esteja presente, ela vem apenas a serviço de demandas sobre o texto lido, cujas respostas encontram-se no próprio texto, como “descrever o personagem do texto”, por exemplo. Em nossas análises, observamos que a coleção didática, embora contemple às exigências do Programa Nacional do Livro Didático (PNDL) e dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) quando orientam sobre a presença de conteúdos temáticos relacionados à cultura de um povo, não toma este conteúdo temático para desenvolver um trabalho linguístico mais significativo. Comparando a presença de textos ligados à cultura oral com outros de natureza diversa, na mesma coleção didática, percebemos que aqueles textos não podem ser reescritos, criados ou reinventados pelos alunos. Estaríamos em contato com textos que apenas podem ser circulados e não escritos ou reescritos pelos alunos – quando muito, por escritores consagrados? – Ao considerar este impasse entre circular, repetir – para que se guarde uma memória de uma cultura – e produzir, buscamos, através da análise tridimensional de Fairclough (1989; 1997; 2001) mostrar que incidem sobre o produto “livro didático” um discurso dissonante sobre quais textos fazem parte da literatura oral e como se deveria trabalhar a oralidade e a escrita na aula de língua portuguesa. Se, por um lado, muitas pesquisas já se concentraram na relação livro didático/produção textual, ainda não lemos, na literatura, significativos trabalhos que apresentam como problemática uma certa imprecisão entre o que seria da ordem da literatura oral e do trabalho com a “oralidade” em sala de aula.