PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS DORES: VIOLÊNCIA E SILÊNCIO NO ROMANCE DE BEATRIZ BRACHER
Silêncio; Violência; Não Falei; Beatriz Bracher.
Tendo em vista uma abordagem da literatura que investiga as particularidades linguísticas da criação artística e a representação da vida social, conforme a crítica integrativa de Candido (2014, 2017), analisamos o romance contemporâneo Não falei, da escritora brasileira Beatriz Bracher, a partir das categorias violência e silêncio. A obra lida com a narração memorialística de um homem que viveu a tortura durante a ditadura civil-militar brasileira, período em que sofreu, além da subjugação física, a perda de um amigo, Armando, militante político morto pelo Estado, cuja captura é atribuída à delação do próprio narrador. Nesse ínterim, estabelecem-se entrecruzamentos entre a vivência violenta e as figurações do silêncio, tanto no interior da cena de tortura, em que calar significa resistir, como no presente, quando o protagonista permanece hesitante em elaborar o passado para os familiares, amigos e conhecidos. Considerando, assim, que a experiência-limite da tortura é determinante para a vida da personagem central da narrativa, que não consegue abandonar o peso do passado, estudamos a violência a partir das contribuições de Jaime Ginzburg (2012, 2017) e Márcio Seligmann-Silva (2000), observando, quanto à temática, seus impactos traumáticos, para os quais aponta a teoria psicanalítica de Sigmund Freud (1974, 2012). Igualmente, observadas as diversas dimensões em que o silêncio se estabelece como relevante na narrativa, em especial naquelas instâncias que retomam as agressões vividas e seus efeitos, partiremos de uma compreensão situada do silêncio como signo (BARTHES, 2003), que, diferenciando-se das maneiras de significar da linguagem (ORLANDI, 2007), pode evidenciar, potencialmente, opressões sociais (HOLANDA, 1992). O estudo dessas questões aponta para a relevância da obra literária na manifestação de uma perspectiva singular de um acontecimento histórico traumático, evidenciando, por meio da situação ficcional, aquilo que foi encoberto pelos discursos oficiais.