Ideação suicida, parassuicídio, depressão e violência em travestis e transexuais: estudo analítico e transversal.
Saúde Mental; Suicídio; Ideação Suicida; Pessoas Transgênero.
No mundo, anualmente, ocorrem milhões de suicídios e parassuicídios, sendo temas reconhecidos como prioridade da Saúde Pública. Os fatores para esse tipo de morte incluem aspectos biológicos, psicológicos e sociais. Travestis e transexuais, pessoas expostas a eventos estressores provocados pelo preconceito e violência, podem tornar-se mais propensas a desenvolver certo grau de isolamento social e psicológico, elementos que contribuem para o risco de ideação suicida. Neste sentindo, esta pesquisa objetivou analisar a associação entre ideação suicida e aspectos sociodemográficos, de saúde-doença, de depressão, de violência e parassuicídios em travestis e transexuais. Trata-se de um estudo com abordagem quantitativa, transversal, do tipo analítico, desenvolvido junto a quatro Organizações Não Governamentais de Direitos de Pessoas Travestis e Transexuais no Rio Grande do Norte. A população foi constituída por 58 sujeitos. A coleta de dados ocorreu no período de novembro de 2015 a junho de 2016, utilizando-se três instrumentos específicos: (1) Escala de Ideação Suicida de Beck; (2) Inventário de Depressão de Beck; e (3) Questionário de informações sociodemográficas, de saúde-doença, violência e parassuicídios. Os dados coletados foram organizados e armazenados em um banco de dados construído no software Microsoft Office Excel® 2016 e, posteriormente, importados para o Software R versão 3.3.1 para realização de testes. Para a análise descritiva, consideraram-se as frequências absolutas e relativas, medidas de tendência central e de dispersão. Para verificar a associação das variáveis, aplicou-se o teste Qui-quadrado de Pearson para independência e, quando os pré-requisitos para o teste não foram atendidos, aplicou-se o Teste Exato de Fisher. Adotou-se o nível de significância de 5%. Quanto às questões éticas, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob Parecer nº 1.314.559 de 09/11/2015. Em relação aos resultados, sobre as características sociodemográficas, prevaleceu a identidade de gênero transexual (62,1%); sujeitos jovens com faixa-etária de 18 a 29 anos (69%); solteiros (81%); de escolaridade menor ou igual a ensino médio (77,6%); raça negra ou parda (69%); em atividade de prostituição (29,3%) ou sem ocupação laboral (17,2%); e com renda mensal de até um salário mínimo (44,8%). De acordo com a avaliação de níveis depressivos, estes variaram entre mínimo (41,4%), leve (31%), moderado (25,9%) e grave (1,7%). Dos aspectos de saúde-doença, 44,8% afirmaram uso de silicone industrial líquido e estavam sob hormonoterapia sem acompanhamento profissional (67,2%). Na análise das experiências de processos de vitimização, evidenciou-se que 96,6% haviam sido vítimas de algum tipo de violência. Entre os aspectos de parassuicídios, destaca-se que 34,5% apresentaram, no mínimo, uma tentativa anterior de suicídio. Na verificação de presença de Ideação Suicida (IS), constatou-se que 41,4% apresentaram IS ativa e/ou passiva. Verificou-se associação estatisticamente significante com a presença de IS as seguintes variáveis: níveis de depressão (p=0,0029); violência escolar (p=0,0122) e expulsão do seio familiar em razão da identidade de gênero (p=0,0103); e fatores parassuicídios: tentativa prévia de suicídio (p=0,0080), e intensidade moderada ou forte da vontade de morrer na última tentativa de suicídio (p=0,0206). Não houve associação estatisticamente significante entre IS e aspectos sociodemográficos e de saúde-doença. Evidenciou-se que as pessoas travestis e transexuais participantes do estudo possuíam elevados escores de IS. Destarte, rejeita-se a hipótese nula (H0), e aceita-se a hipótese alternativa (H1) ao afirmar que há associação de IS com aspectos de depressão, violência e parassuicídios em um grupo de pessoas travestis e transexuais.