Filiação religiosa como um marcador de grupo em uma variação do jogo dos bens públicos e a influência da personalidade e espiritualidade na cooperação.
religiosidade; coalizão; comportamento humano; evolução; psicologia evolucionista
Uma das hipóteses evolucionistas a respeito da manutenção da religião em populações humanas propõe que ela funcionaria como uma facilitadora da cooperação intra-grupo. Dessa forma, avaliamos se a filiação religiosa funcionaria como um marcador de grupo em uma variação do jogo dos bens públicos. Além disso, verificamos a influência da personalidade e espiritualidade no comportamento cooperativo do jogo. No total, a amostra foi composta por 527 estudantes universitários da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Além das questões socio-demográficas, escalas de personalidade e espiritualidade, os sujeitos participaram de um experimento em suas salas de aula. 237 indivíduos participaram do Jogo 1 e 290 do Jogo 2. O Jogo 1 consistia em quatro urnas (Católicos, Evangélicos, Outras religiões e Ateus) atrás de um biombo e cada participante ganhava cinco chocolates. Desses, dois deveriam ser doados obrigatoriamente para duas urnas diferentes e os três restantes poderiam ser doados para qualquer urna, de zero a três chocolates. Os chocolates não doados ficavam com os participantes. Esse procedimento era realizado por três rodadas e, ao final, o total de chocolates doado para cada urna retornava para os indivíduos pertencentes a cada grupo naquela turma (ex: os chocolates da urna "Católicos" era dividido entre aqueles que haviam se auto declarado Católicos). O Jogo 2 possuía o mesmo formato e condições, no entanto, os sujeitos eram informados que ao final das três rodadas, os chocolates de cada urna seriam divididos entre indivíduos de cada grupo em uma outra turma. Participantes com e sem religião apresentaram uma doação total média similar nas três rodadas em ambos os jogos. No entanto, os indivíduos doaram mais para a urna do seu grupo, quando havia o retorno dos chocolates ao final, no Jogo 1, e no Jogo 2 apenas o grupo "Outras religiões" não doou mais para a urna representando o seu grupo. Uma análise de regressão não paramétrica indicou que a melhor variável preditora para a urna escolhida, em ambos os jogos foi a religião que o participante pertencia. Em relação ao total doado, uma análise de regressão linear hierárquica indicou que as melhores variáveis preditoras para o total doado nas três rodadas foram o tipo de jogo realizado e o fator de personalidade relacionado com comportamentos cooperativos. Esses resultados sugerem que a filiação religiosa pode funcionar como um marcador de grupo e mediar a cooperação, sem uma reciprocidade imediata. No entanto, em relação a quantidade de chocolates doados, o fato de haver ou não o retorno ao final do jogo e a personalidade dos indivíduos, parecem ser mais relevantes do que a prática ou filiação religiosa. Esses resultados corroboram a hipótese da religião como um facilitador da cooperação intra-grupo e acrescentam uma análise mais ampla ao controlar o total doado por outras variáveis além da filiação e prática religiosa.