EXPERIÊNCIAS DE ESTUDANTES COTISTAS NO CURSO DE MEDICINA DA UFRN: UMA COMPREENSÃO FENOMENOLÓGICA
Estudantes de medicina; cotistas; pesquisa fenomenológica; Martin Heidegger.
Até a promulgação da Lei de cotas de 2012, os cursos de medicina do país foram habitados quase em sua totalidade por indivíduos socialmente mais abastados e, desde então, esse corpo discente começou a mudar. A partir de 2012, inaugurou-se um novo momento na universidade e na medicina brasileira, que passaram a ser ocupadas por outros corpos, histórias e modos de existir. A heterogeneização do perfil universitário demanda um olhar mais atento e cuidadoso aos novos modos de ocupar a universidade e o ensino médico. A fim de nos aproximarmos dessa realidade, partimos da seguinte questão de pesquisa neste trabalho: Quais os sentidos de ser um estudante cotista no curso de medicina da UFRN? Objetivamos compreender experiências de ser-cotista no curso de medicina da UFRN à luz da hermenêutica heideggeriana. Esta é uma pesquisa fenomenológico-hermenêutica e utilizou a entrevista narrativa como instrumento. Foram entrevistados três estudantes do curso de medicina do câmpus Natal que ingressaram por meio de vagas de ações afirmativas. O caminho utilizado na interpretação das narrativas funda-se no círculo hermenêutico e diz de uma aproximação do nosso modo compreensivo de existir como uma possibilidade para o fazer pesquisa em psicologia. As narrativas produzidas neste estudo evidenciam os desafios enfrentados por estudantes cotistas para permanecer no curso e sentirem-se pertencentes. Condições estruturais da organização do curso como as distâncias entre campos de prática, a elevada carga horária do curso, os altos custos envolvidos na permanência universitária e a fragilidade das políticas de assistência estudantil foram apontados como aspectos que contribuem para o desenraizamento dos estudantes no curso. Observa-se ainda que o pertencimento nesse curso é atravessado pelos sentidos sedimentados do ser-médico enquanto um indivíduo branco, de classe média/alta, oriundo do ensino privado. Cotistas negros, de baixa renda e pessoas com deficiência relatam sentir que o curso não foi pensado para existências como as suas. Os resultados sugerem que ainda é necessária a realização de mais estudos compreensivos que investiguem as experiências de estudantes cotistas em universidades públicas e as condições de permanência oferecidas a esses estudantes.