DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA DIVERSIDADE EVOLUTIVA DE MYRTACEAE NA MATA ATLÂNTICA
Biogeografia; Diversidade filogenética; Endemismo filogenético; Floresta Atlântica; Myrteae.
A Mata Atlântica é um dos hotspots globais de biodiversidade e é essencial compreender os processos ecológicos e evolutivos responsáveis pela formação destes locais altamente diversos. Essa compreensão permite, além de um avanço teórico sobre os fatores que geram diversidade, um avanço prático na maior efetividade da priorização espacial de áreas a serem protegidas, contribuindo para a conservação dos hotspots. Na Mata Atlântica, Myrtaceae se destaca como a família de plantas lenhosas mais diversa (691 espécies) e é um excelente modelo para estudos pois seus padrões de riqueza são representativos de outros táxons. Assim, este trabalho teve dois objetivos: (1) mapear métricas de diversidade evolutiva de Myrtaceae nesse domínio para entender a evolução da flora da Mata Atlântica e (2) avaliar se a atual rede de unidades de conservação da Mata Atlântica capta a diversidade evolutiva do domínio representada na família Myrtaceae. Utilizamos informações de trabalhos florísticos provenientes de duas bases de dados, Caaporã e NTT, as quais foram revisadas antes das análises para corrigir potenciais erros de ocorrência de espécies e nomenclatura. Os registros utilizados totalizaram 492 espécies de Myrtaceae ocorrentes em 1282 localidades, com ampla amostragem do espaço geográfico e robusta representação do espaço ambiental do domínio. Encontramos que os hotspots evolutivos estão mais concentrados na porção sul da Mata Atlântica, no sul e sudeste do Brasil. Na costa litorânea brasileira, do sul até o nordeste, estão as áreas com alta concentração de linhagens mais derivadas e espécies que são mais aparentadas entre si, enquanto no interior da região sul do domínio, estão concentradas as linhagens que divergiram em pontos mais profundos da evolução da família. A existência de refúgios climáticos temporalmente estáveis ao sul do domínio, bem como o histórico de colonização e expansão dessa família no continente sul-americano, o qual se inicia no sul do continente e se expande para o norte, podem explicar a concentração das linhagens mais antigas no sul do domínio. Em Santa Teresa/ES e nas florestas costeiras do sul baiano (Ilhéus/BA), registramos a maior diversidade de endemismo filogenético da família, são locais que abrigam linhagens únicas, restritas a essas regiões. Os padrões de diversidade filogenética de Myrtaceae descritos aqui corroboraram com os padrões já descritos para outros táxons terrestres, como aves e artrópodes, o que reforça o uso de Myrtaceae como grupo modelo para análises macroecológicas e macroevolutivas na Mata Atlântica. A atual rede de áreas protegidas na Mata Atlântica abrange parte da variação da história evolutiva da família representada nas métricas de endemismo filogenético e distância média da raiz, mas não capta a variação das métricas de diversidade e variabilidade filogenética, sendo assim estudos futuros devem focar na indicação de áreas prioritárias que captem mais componentes evolutivos para ampliar a proteção da flora numa perspectiva de sua evolução. Conservar o potencial evolutivo é uma forma de aumentar as chances de resposta dos táxons aos preocupantes cenários de mudanças ambientais preditos para o futuro. Portanto, os resultados aqui produzidos devem ser incluídos em análises de priorização espacial.