REPENSANDO A RESTAURAÇÃO ECOLÓGICA SOB A LENTE DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E DOS SINAIS DE ALERTA PRECOCE PARA A DESERTIFICAÇÃO
Caatinga; diretrizes para restauração sustentável; dissimilaridade; estados estáveis alternativos; mapas interativos; modelos de adequabilidade; recuperação e colapso da vegetação; restauração da resiliência; seleção de espécies.
A Caatinga contempla grande diversidade biológica e de serviços ecossistêmicos e funciona como um importante sumidouro de carbono. Entretanto, esse bioma está entre as regiões do globo mais sensíveis às variações climáticas e apresenta condições ambientais e ações antrópicas que diminuem sua resiliência. Esse trabalho pretende: 1) Identificar sinais de alerta precoce para mudanças entre estados vegetado e desertificado e indicar áreas prioritárias e ações emergenciais que visam o melhor retorno dos investimentos em restauração e o combate à desertificação; 2) Criar diretrizes que orientem uma restauração florestal sustentável com base nas mudanças de composição por perda, ganho e substituição de espécies frente às mudanças climáticas previstas; e 3) Disponibilizar listas de espécies que podem ser plantadas hoje e que resistirão às mudanças climáticas para 1.112 municípios por meio de um website interativo, aproximando os resultados da modelagem à tomadores de decisão e população em geral. Para o capítulo um utilizamos uma série temporal de 20 anos de dados de Índices de Vegetação Melhorada (EVI, 2000–2019), calculamos a autocorrelação residual (desaceleração crítica) e a tendência linear da série temporal para identificar se o sistema tende a se recuperar ou a colapsar em termos de cobertura vegetal. Detectamos que 8.77% da Caatinga tem se aproximado de um ponto crítico de transição e que desse montante, 66.121 km2 apresentou tendência para a recuperação e uma área de 7.938 km2 para o colapso da cobertura vegetal. Tanto os locais com tendência à recuperação quanto os locais com tendência ao colapso se concentram em áreas de vegetação natural, indicando que poucas áreas degradadas tendem a se recuperar sozinhas e que muitas áreas de vegetação natural na Caatinga estão propensas a perder serviços ecossistêmicos importantes. Acreditamos que todas essas áreas necessitam de restauração florestal seja por restauração passiva ou ativa dentro de cada nível de urgência. Para o capítulo dois e três construímos modelos de adequabilidade climática no presente e no futuro (2050) para 606 espécies lenhosas da Caatinga. No capítulo dois, identificamos áreas de ganho de espécies, de perda de espécies e áreas onde haverá substituição de espécies, para assim, sugerirmos diretrizes para a restauração frente às mudanças climáticas futuras. Previmos 28,5 % das espécies apresentarão expansão de área geográfica, 71,5 % redução e 0,5 % sofrerão extinção para todo o território da Caatinga. As extinções locais, por outro lado, ocorrem em 88,9 % das regiões, sendo que apenas 11,1% das áreas da Caatinga ganharam espécies. Foram registrados cenários de perda de espécies e alta mudança por substituição de espécies o que torna o planejamento da restauração muito mais desafiador. Além desses cenários, outros foram analisados somando seis combinações de mudanças de composição que necessitam de diferentes diretrizes para a prática sustentável da restauração ecológica. A diretriz de restauração para cada cenário são fundamentadas nas seguintes questões: 1) qual método de restauração priorizar (restauração espontânea ou plantio direto); 2) quando se deve investir na manutenção de unidades de conservação adjacentes devido à necessidade futura de áreas fonte; 3) quais espécies plantar e onde plantar espécies ameaçadas e restritas ao bioma frente às mudança climáticas previstas. No capítulo três detectamos a mudança na riqueza de espécies em 1.112 municípios, criamos 1.112 listas com as espécies que melhor responderão as mudanças climáticas previstas para cada município, publicamos as listas em um site interativo baseado em mapas e finalmente esquematizamos esse fluxo de trabalho para que esse método possa ser aplicado em outras áreas do mundo. Previmos que dos 1.112 municípios da Caatinga, 809 apresentaram uma redução na riqueza de espécies, 286 ganhos, e 17 manutenção. Mesmo nos municípios em que o saldo foi positivo, pode ter ocorrido perda de espécies ao mesmo tempo que um número maior de outras espécies foram ganhas por colonização. Portanto, todas as regiões a serem restauradas necessitam de investigações locais para a escolha apropriada de espécies sendo que essas informações devem estar acessíveis aos tomadores de decisão e população em geral. Nossa página interativa é um exemplo de como aproximar a produção científica de modeladores às necessidades práticas de empresas e pessoas que necessitam implementar projetos de restauração. Isso porque com apenas um celular ligado à internet o usuário pode obter uma lista de espécies que podem ser plantadas com sucesso em seu município e que sobreviverão às mudanças climáticas futuras. Essa difusão de informação pode criar um projeto de ampla escala de restauração sustentável a médio e longo prazo.