SERVIÇO SOCIAL, CLASSE, GÊNERO E RAÇA: tendências teórico-metodológicas e as possíveis contribuições da Teoria Unitária
Serviço Social. Gênero. Classe. Raça. Sexualidade. Teoria da Reprodução Social. Teoria Unitária.
O presente trabalho consiste em uma análise das tendências teórico-metodológicas utilizadas nas produções científicas do Serviço Social brasileiro sobre as relações sociais generificadas e racializadas da sociedade capitalista, a partir da ontologia marxista e da crítica da Teoria da Reprodução Social (TRS). Para tanto, compreendemos que o Serviço Social, reconhecido como área de conhecimento, a partir da sua maioridade intelectual visceralmente articulada ao adensamento marxista, a partir da década de 1980, passou a desenvolver pesquisas sobre temáticas diversificadas relacionadas a complexidade da vida social sob a ordem do Capital, hoje sistematizadas pelos Grupos Temáticos de Pesquisas (GTPs) da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS). Como reflexo desse movimento, há o crescimento expressivo das tentativas da profissão em categorizar as relações sociais generificadas e racializadas do capitalismo. Através de amplo e diversificado arcabouço teórico-metodológico, essas análises se fundamentam em matrizes teóricas distintas. Tomamos como exemplos emblemáticos deste avanço as adesões ao feminismo materialista francófono e ao feminismo interseccional, como correntes epistemológicas capazes de fornecer ferramentas heurísticas de apreensão da condição das mulheres e das pessoas racializadas no capitalismo, assim como o influxo pós-moderno, que de forma menos crítica subsidia análises frequentemente fragmentadas da realidade social. Em adição objetivamos também a) mapear os principais arcabouços teórico-metodológicos desenvolvidos em pesquisas do Serviço Social sobre a relação entre classe, gênero, raça e sexualidade; b) analisar as contribuições e os limites teórico-metodológicos do feminismo materialista francófono, expressamente uma das perspectivas mais utilizadas por pesquisadoras do feminismo na atualidade do Serviço Social; e c) apreender como a relação entre Serviço Social e feminismo-marxista tem sido desenvolvida historicamente no interior da profissão, demarcando as principais determinações que limitam e possibilitam uma análise a partir da totalidade social. Esta pesquisa, alicerçada no método marxista combinado ao ponto de vista feminista-marxista e decolonial e considerando a crítica da TRS ou Teoria Unitária, parte do pressuposto de que produção e reprodução social são dimensões de uma unidade dialeticamente indissociável, impactada de forma sistemática pela reconfiguração da sociabilidade capitalista. Tal perspectiva teórica desempenha a tentativa de sintonizar a práxis feminista à teoria marxista a partir da teoria valor-trabalho de Marx, na compreensão do capitalismo enquanto totalidade fundadora do racismo e de um novo patriarcado - nesta pesquisa categorizado como cisheteropatriarcado, por meio de processos sócio históricos constitutivos do sociometabolismo do capital. A pesquisa foi construída metodologicamente a partir de pesquisa bibliográfica-exploratória de caráter quanti-qualitativo e analisou cinquenta (50) artigos científicos publicados entre os anos de 2010 e 2021 na Revista Temporalis. A análise dos dados aponta que os artigos estão situados em três temáticas guarda-chuvas: Mulheres, gênero e feminismos em 64% dos artigos; Raça/etnia e luta antirracista em 22%; e Sexualidade, diversidade sexual e luta LGBT+, em 14%. Os artigos analisados estão situados em quatro tendências: 1) crítica de cariz marxista; 2) crítica-eclética-pós-moderna; 3) formal-descritiva; e 4) indefinida. Localizamos expressivo esforço epistemológico desempenhado pela categoria das/os assistentes sociais em adensar os estudos sobre gênero, raça/etnia e sexualidade, a partir da perspectiva crítica, por mais que haja o recurso a diferentes autores/as fundamentados/as em matrizes teóricas diversificadas. Na tentativa de avançarmos continuamente, esta pesquisa considera que a perspectiva da Teoria Unitária pode oferecer a materialização de uma sintonia mais profunda entre o marxismo e as práxis feminista e antirracista, na perspectiva ontológica de produção de conhecimento, alicerçada no materialismo histórico-dialético, e neste sentido contribuir no desenvolvimento de um feminismo-marxista ou marxismo-feminista que tenha como primazia o estudo da totalidade social, no qual raça/etnia, gênero e sexualidade sejam compreendidos como totalidades parciais desta totalidade.