A CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES INFANTIS DE GÊNERO POR MEIO DA LITERATURA INFANTIL NA ESCOLA
Identidades infantis de Gênero. Escola. Estudos Culturais em Educação. Literatura Infantil.
Esta dissertação tem como objeto de estudo a contribuição da literatura Infantil na escola para a (con)formação das identidades infantis de gênero. Para realizála, utilizei os pressupostos investigativos dos Estudos Culturais em Educação, de vertente pós-estruturalista, os Estudos de Gênero e a contribuição de Michel Foucault no que diz respeito ao conceito de poder. Meu objetivo foi analisar e problematizar o modo como a literatura infantil na escola contribui para a construção de identidades infantis de gênero. Entendo que a criança se constitui sujeito a partir de uma construção histórico-social e cultural, capaz de interagir com a sociedade em que vive, possuidora de dependências biológicas e físicas que passam por constante desenvolvimento até atingir um certo grau de independência. Existe um grande consenso no meio acadêmico-científico de que a criança consegue aprender e se desenvolver produzindo, inclusive, novas culturas dentro e fora dos espaços escolares. Ao mesmo tempo, destaca-se que a interação da criança com o mundo que a cerca, incluindo os artefatos culturais aos quais tem acesso, contribui para a formação de suas identidades, considerando-se, nesse caso, a cultura. Apesar de existir uma variedade de artefatos culturais, é notório que a literatura infantil passa a ser compartilhada com a criança primordialmente na escola. Essa literatura pode, entre outros efeitos, produzir e fixar estereótipos que determinam modos de viver e ser do menino ou da menina. Preocupada com a formação identitária das crianças a partir da literatura infantil utilizada nas escolas, busquei estratégias teóricometodológicas para desenvolver uma pesquisa qualitativa de inspiração etnográfica em um Centro Municipal de Educação Infantil, na zona sul de Natal – Rio Grande do Norte/Brasil. Durante os meses de setembro de 2016 e junho de 2017 realizei visitas à escola com registros em um diário de campo e fotografias sobre as vivências nos momentos de mediação de leituras realizadas pela professora de uma turma de nível IV. Essas observações tinham como foco identificar e registrar situações relacionadas à construção da identidade de gênero das crianças na mediação da leitura de livros trabalhados pela escola e que acabaram sendo seis livros que reforçam a formação da identidade estereotipada de ser menino e menina. Além dos materiais obtidos nas observações, considerei um site de internet e três livros/blocos de atividades atualmente disponíveis no mercado literário brasileiro. Essas fontes adicionais também fazem referência a estereótipos das identidades infantis de gênero. Fiz essas escolhas por considerar que era importante evidenciar que os estereótipos de gênero evidenciados na literatura infantil compõem uma rede conceitual a qual as crianças têm acesso e não estão isolados apenas nos livros. Os resultados desta pesquisa apontam, entre outros achados, para o fato de que a literatura infantil não é neutra em seus contos; ela promove maneiras de falar, de se comportar e de ver o outro. A literatura infantil, de um modo geral e independentemente de serem contos clássicos ou não, fortalece a ideia de identidades de gênero, em sua maioria, homogênea para as crianças e a ideia formada e definitiva sobre a identidade do outro. Também se caracterizaram alguns desdobramentos a partir da própria identidade (con)formada pela literatura infantil, como, por exemplo, os ensinamentos da própria literatura sobre estética e princesamento. Além de se tornarem um herói, uma princesa ou uma heroína, as crianças utilizaram assessórios que as identificavam esteticamente a partir dos conceitos predeterminados pela literatura. Percebi através das análises que algumas crianças não se relacionavam com as demais por não concordarem com as identidades ali assumidas. A constatação das amarras sociais, tão disseminadas por meio da literatura infantil e a influência das mesmas nas atitudes e omissões das crianças, nos leva a refletir sobre o papel que a literatura pode desempenhar na formação das identidades infantis de gênero.