REFLEXÕES SOBRE LOUCURA E RACISMO A PARTIR DA LITERATURA DE LIMA BARRETO
Racismo. Loucura. Literatura. Lima Barreto.
Esta pesquisa teve como objetivo refletir sobre o racismo e a loucura a partir da literatura do escritor negro Lima Barreto (1881-1922). Através da análise de conteúdo e de uma perspectiva interdisciplinar que envolve o diálogo entre literatura, sociologia, antropologia, ciência política e história, buscou-se realizar um trabalho ensaístico a fim de alimentar as discussões trazendo outros enfoques que poderão ampliar o debate acerca da obra berreteana, que, aqui, é tomada como um testemunho de um homem negro que não sobreviveu à opressão de raça e classe. Percebe-se que a Loucura e o Racismo, além da pobreza, tristeza, solidão e ressentimento atravessaram a vida do escritor. A partir de uma perspectiva interseccional que considera o cruzamento de marcadores sociais da diferença como raça, classe e loucura, entende-se que o escritor foi vítima do racismo que se estruturava na sociedade brasileira pós-escravista. Naquele contexto, se exacerbava a falta de oportunidades, a ausência de políticas de inserção dos negros “libertos”, os traumas oriundos do regime de escravização, a negação da cultura dos escravizados, as dores indizíveis e inomináveis daqueles que, também, atingiram “o fundo”, parafraseando o filósofo italiano Giorgio Agamben, ao se referir aos “muçulmanos”, isto é, os desuminazados, dos campos de concentração de Auschwitz. Para este estudo, além das obras já citadas, outras nos ajudarão a mergulhar na imensidão do pensamento barreteano, tais como: Recordações do Escrivão Isaías Caminha, Triste Fim de Policarpo Quaresma, Diário Íntimo, Clara dos Anjos, e alguns contos do autor, além das biografias escritas por Francisco Assis Barbosa e Lilia Moritz Schwarcz. Nas interpretações do conteúdo analisado, autores (as) como Giorgio Agamben, Frantz Fanon, Grada Kilomba, Michel Foucault, Achille Mbembe, Djamila Ribeiro, Silvio Almeida entre outros (as), serão acionados (as) para que possam ajudar a ecoar a voz de Lima Barreto. Considera-se que ele foi uma testemunha e um resistente em uma época em que negros, loucos e pobres eram encarcerados por uma política higienista influenciada pela eugenia. Sobrevivendo na precariedade, com escassez de recursos, crise familiar, se alcoolizando até mergulhar em delírios e sofrimentos mentais, sem obter reconhecimento e espaço na cena intelectual, Lima Barreto resistiu a ponto de não permitir que sua presença negra fosse abafada pelo rolo compressor-enbranquecedor. Frente à loucura, que é uma sociedade racista, o escritor nos legou o seu testemunho: uma extensa e rica literatura negra, crítica do racismo e da crueldade da vida manicomial.