MULHERES NA ESTRADA: ENCONTROS ETNOGRÁFICOS NAS ROTAS DA AMÉRICA DO SUL
Mulheres. Viajantes. Agência. Deslocamentos. América do Sul.
As diversas formas que as mulheres pegam a estrada na América do Sul são marcadas pela maneira de organizar, executar e perceber uma viagem de mochila na região. Há vários contornos possíveis nessas produções culturais, que narram outras perspectivas de uma prática historicamente masculinizada e associada ao risco e ao perigo. Busco por meio desta etnografia multissituada, estabelecer um diálogo entre antropologia feminista, geografia feminista e as viagens de mochila, com o objetivo de analisar as experiências das mulheres que viajam de mochila pelas rotas da América do Sul. Motivada por transformar uma experiência social em tema de pesquisa, e incentivada por certa experiência pessoal enquanto viajante, realizei pesquisa de campo etnográfica multissituada entre os anos de 2019 e 2022. Chamei essa empreitada de “mochilão etnográfico”. Este consistia em experimentar o trânsito para encontrar outras viajantes na estrada. O itinerário foi construído entre diferentes países: Bolívia, Peru, Chile, Argentina e Brasil. Os encontros etnográficos ocorreram no decorrer do trajeto da pesquisa, tanto em espaços físicos quanto digitais. Utilizar o encontro como estratégia metodológica possibilitou estabelecer 10 interlocuções com mulheres viajantes latino-americanas de diferentes nacionalidades, perfis sociais e estilo de viagem. Por meio da experiência compartilhada foi possível a reconstrução dos trajetos, caminhos e percursos; a contextualização de lugares, espaços, eventos, trajetórias; a contrastação das experiências e, também, a explicitação de categorias e formas de ser, se deslocar e permanecer, comum aos diferentes grupos. Dessa forma, os achados de pesquisa dão conta que as categorias de viajantes são construídas mediante as formas de trabalho desenvolvidas durante o trajeto e a escolha dos meios de deslocamento e hospedagem utilizados. Os encontros na estrada e os desembarques se constroem como parte igualmente importante da experiência. Foi possível perceber, ainda, que essas viagens são experiências culturais multifacetadas, que desafiam construções culturais estabelecidas, como a ideia do perigo, e expandem os processos de formação de si. Ademais, são sustentadas por meio das práticas de trabalho, das estratégias de deslocamento físico e subjetivo, e também pela transposição de fronteiras.