A POTENCIA DOS RESTOS NAS NARRATIVAS DE SUJEITOS DISSIDENTES DE GENERO E SEXUALIDADE
gênero, sexualidade, dissidências, narrativas, fotografia
O presente trabalho pretende co-construir narrativas singulares das dissidências de gênero e sexualidade com sujeitos dissidentes da cidade de Natal/RN e seus acervos fotográficos pessoais. A proposta de co-construção se opõe à discursividade que reforça a representação patológica das dissidências de gênero e sexualidade e a invisibilização das singularidades. Esta discursividade está presente no campo dos estudos sobre a saúde mental de pessoas dissidentes os quais, através do viés quantitativo de pesquisa, destacam as acentuadas formas de sofrimento psíquico na população LGBT+, bem como a recorrência do fenômeno do suicídio neste grupo. Portanto, emerge a necessidade de visibilizar as experiências de pessoas dissidentes através da complexificação das narrativas das dissidências, além de problematizar a produção destas capturas pela morte. Parte-se da perspectiva de que a morte de corpos dissidentes está intimamente relacionada aos efeitos da biopolítica, proposta por Michel Foucault, e da necropolítica, proposta por Achille Mbembe. Desse modo, propõe-se que aqueles sujeitos que sobrevivem carregam em vida as histórias das marcas destes processos, mas também os restos do vivido nos quais pode residir a potência da resistência. A partir da ética psicanalítica, esta pesquisa emerge como um trabalho de memória, que aposta no reencontro com os restos do vivido para fazer resistência aos enquadramentos normativos. Para tanto, sujeitos dissidentes de gênero e sexualidade foram convidados a narrar suas próprias histórias de dissidência. Apostando na dimensão do arquivo enquanto algo que faz materializar um corpo, o convite à narrativa contou com o suporte de fotografias do acervo pessoal de cada sujeito. Com os registros do diário de campo da pesquisa, dos textos transcritos de cada escuta realizada e das fotografias compartilhadas, têm sido produzidas, pela pesquisadora, escritas que contam o que foi escutado de cada participante, buscando construir narrativas singulares. Estas escritas narrativas serão compartilhadas com as pessoas participantes para que, no tempo retroativo do a posteriori freudiano, possam nelas intervir, rever, reescrever. Duas das quatro escutas realizadas são aqui apresentadas, na forma de narrativas que compõem memórias da dissidência e fazem frente às estatísticas de morte e de adoecimento psíquico. A fotografia entra na cena do narrar como imagem que pede palavra. O resgate das memórias com o suporte fotográfico faz emergir a intimidade daquilo que comparece no corpo – um convite ao trabalho da memória e da nomeação. Endereçar as memórias das dissidências à tarefa desta pesquisa parece produzir efeitos singulares nos sujeitos, os quais poderão ser discutidos em breve, quando a narrativa for vista novamente e reescrita com as pessoas participantes. Espera-se, portanto, que seja possível fazer emergir com maior nitidez os efeitos desta aposta ético-política na potência dos restos.