MEMÓRIAS (AUTO)BIOGRÁFICAS E CULTURA DO ALGORITMO: UMA ANÁLISE DAS ESCRITAS DE SI RECONSTRUÍDAS NO (PELO?) FACEBOOK
Palavras-chave: Memórias; Cultura do algoritmo; Subjetividade híbrida; Materialidades da Comunicação; Facebook.
As memórias, bem como as lembranças, os esquecimentos, os silenciamentos, têm sido dos elementos centrais das vivências e impasses do campo digital, e, por conseguinte, da investigação e dos debates científicos. No âmbito do indivíduo e de sua autonomia para a produção de escritas e reescritas de si, discute-se o entrelaçamento das memórias culturais pessoais e sociais (DIJCK, 2007) em um contexto de ampla presença e participação dos artefatos midiáticos que consolidam a emergência de uma subjetividade cada vez mais híbrida. Isto significa que as memórias, que antes resultavam da articulação da própria (re)construção que se faz de si somada a dos nós de contato da rede social e dos materiais como fotos, cartas, bilhetes, vídeos ou áudios, agora, no digital, contam com a presença de diversos elementos e objetos, físicos e/ou simbólicos, que compõem os sistemas da denominada cultura dos algoritmos (STRIPHAS, 2015). Parte-se da percepção de que estes são o resultado de um modelo econômico e social que especializou uma parte de suas tecnologias para o desenvolvimento de uma leitura, ordenamento, análise e, por conseguinte predição cada vez mais precisos e individualizados por meio dos mecanismos matemáticos cujas plataformas de redes sociais são apenas uma de suas faces (BUCHER, 2018; ZUBOFF, 2020; SILVEIRA, 2017; BRUNO, 2013). Questiona-se como o indivíduo propõe a escrever-se em uma estrutura de mediação alicerçada na cultura do algoritmo e de que maneira a própria estrutura da rede participa da (re)construção das memórias (auto)biográficas. Sob o âmbito metodológico, o recorte analisa as possibilidades disponibilizadas pelo Facebook para a organização e representação das informações, sejam elas de natureza textual, visual ou audiovisual, bem como a relação que os indivíduos estabelecem com tais possibilidades. Tomando por base a perspectiva das materialidades da comunicação e da mídia, o corpus é constituído das análises [1] da interface, reconhecendo-a como manifestação material do sistema algorítmico (JOHNSON, 2007; DIJCK, 2014), [2] da voz institucional, coletada nos documentos de Privacidade e Segurança, Política de Dados, somada a publicações do Facebook Research acerca dos serviços concernentes às memórias e lembranças e [3] da percepção que os usuários possuem acerca da utilização da plataforma quanto aos modos de (re)escrita de si, o reconhecimento das publicações como estratégias de interação e a presença do algoritmo na evocação de lembranças e produções de sentido. A reflexão sugere que, ainda que não seja exatamente sua função inicial, o Facebook aponta caminhos para o indivíduo escrever-se, organizar e armazenar tanto narrativas quanto acervos próprios de memórias. No entanto, quanto à recuperação, representação, atribuições de sentido, estas parecem aprimorar-se na oferta de sistemas automatizados, não permitindo ao usuário a mesma liberdade que a empresa detém sobre os dados por eles gerados.