Auta de Souza, “a poeta de pele clara, um moreno doce”:
Memória e cultura da intelectualidade afro-descendente no Rio Grande do Norte
Auta de Souza, Afro-descendente, Memória, Branqueamento.
Na primeira metade do século XX diferentes grupos de intelectuais estiveram engajados na busca de um ideal de brasilidade. Nisso, duas correntes são percebidas. A primeira foi marcada por um viés saudosista em relação ao passado, sendo formulada pelos intelectuais da região que então gestava-se como Nordeste. Esse grupo de intelectuais ressaltava valores e tradições da aristocracia agrária da região que perdia visibilidade no cenário político e econômico do Brasil. Já a outra corrente, de caráter mais moderno e industrial, foi formada pelos intelectuais do região Sudeste que em detrimento da primeira, estava em ascensão. Este grupo por sua vez, objetivava dar um novo rosto ao Brasil bem como romper com as “raízes” do nosso atraso que na visão deles estavam ligadas ao nosso passado agrário. Isso resultou em diferentes percepções e interpretações sobre nosso passado histórico, e na construção de diferentes perfis para o brasileiro. Nesse sentido, nosso trabalho busca entender como no âmbito da construção de uma história bem como de uma memória oficial para o Rio Grande do Norte se produziu o silêncio a respeito da presença de afro-descendentes no Rio Grande do Norte. Silêncio este que se estendeu à ancestralidade de Auta de Souza (1876-1901) haja vista a posição que ela deveria ocupar dentro do projeto dos intelectuais que ficaram a cargo da formação de uma memória coletiva para o nosso Estado. Auta enquanto personagem histórica relevante nesse projeto dos intelectuais potiguares foi alçada à condição de mulher modelo e elegida no panteão das poetas mais amadas do Rio Grande do Norte, todavia, para que pudesse ocupar tal posição, teve que ser branqueada. Esse processo se iniciou ainda em vida, na sua própria escrita, uma estratégia também utilizada por outros intelectuais de igual condição nesse contexto em que a afirmação da afro-descendência fechava portas, sobretudo no seleto espaço da intelectualidade.