A PRODUÇÃO DE DADOS E INFORMAÇÕES OFICIAIS DO BRASIL PELO IBGE: UMA PRÁXIS REVELADORA DO ESPAÇO GEOGRÁFICO NA ADVERSIDADE DE UMA PSICOSFERA E DE UMA TECNOESFERA DO SÉCULO XXI
IBGE; território usado; técnica; informação; espaço racional.
O espaço geográfico assume a função de “instância social” e somente pode ser plenamente
decifrável se observado enquanto totalidade; de outro modo, ele se distancia da tarefa de ser o
objeto da geografia. Entre os elementos constitutivos do espaço geográfico estão as
instituições. Nada escapa ao espaço, nem mesmo o sujeito que lhe dá sentido, ou seja, o
homem. Se às firmas cabe a função de prover o espaço de bens, serviços e ideias, as
instituições cumprem o papel de materializá-lo, ordená-lo e, até, legitimá-lo. A noção abstrata
relacionada ao espaço geográfico converte-se em algo mais inteligível se o tratarmos como
um conteúdo constituído por fixos, objetos imóveis, e fluxos, objetos móveis, e no qual se dá
um quadro de vida, sendo tal quadro híbrido e, ao mesmo tempo, revestido de materialidade e
de vida social; eis o espaço geográfico historicizado, aqui convertido por Milton Santos e
Maria Laura Silveira em sinônimo de território usado. No espaço geográfico do nosso tempo,
que também se desdobra em espaço racional, estão contidos a técnica, que impõe
hodiernamente uma sujeição do homem à máquina ou às coisas, e a informação, elemento
constitutivo do meio técnico-científico-informacional, assim como a técnica. Esse novo meio
coincide com o período que lhe é homônimo, sendo forjado a partir de uma tecnosfera e de
uma psicosfera próprias da nossa geração. Levando-se em consideração a natureza das
atividades desenvolvidas pelo IBGE, qual seja, a produção de dados e informações relativas
ao território brasileiro, fica transparente o elevado valor social e estratégico desta instituição
nos dias atuais para a leitura do território usado. No passado, à época da sua fundação, o
IBGE simbolizou um embate entre o espontaneísmo e a racionalidade; a perspectiva de um
Estado unitário e um Estado federalista; uma oposição entre a centralização e a
descentralização do poder político; a contraposição do poder central em relação ao poder
local; o antagonismo que separa o autoritarismo da democracia; e, se nos permitirmos olhá-la
por um aspecto ainda mais macro, enxergaremos o contraste entre o Estado e o mercado. A
presença do IBGE se amalgamou na realidade brasileira ao longo de suas mais de oito
décadas de existência e, com uma vocação para ir além dos limites de suas instalações, o
órgão sempre esteve atento às demandas da sociedade e às suas próprias necessidades. Na
atualidade, o IBGE tem concentrado múltiplas tarefas e um dado que pouco se associa a ele é
que a sua atuação favorece o exercício democrático. O projeto de país gestado na
Constituição Federal de 1988 somente se concretiza com os dados que cotidianamente o
IBGE fornece à sociedade. O Pacto Federativo vigente na Carta Magna trata, entre tantos
temas, de rateio de verbas públicas pelos chamados entes da federação. Uma dessas fontes de
recursos é o FPE, já uma segunda fonte corresponde ao FPM. Ambos são determinados pelos
quantitativos populacionais registrados periodicamente pelo Instituto. Cabe então ao órgão
prover a sociedade e os entes federativos de dados confiáveis que remetam à realidade do
país para que o equilíbrio desse pacto acordado possa se manter intacto. A ideia de território é
intrínseca ao cotidiano das atividades desenvolvidas pelo IBGE, daí não haver a dissociação
entre estatística e geografia no órgão brasileiro. Disto isto, a ausência de um departamento de
cunho geográfico junto ao Instituto Nacional de Estatística, na Espanha, por exemplo, nos
instiga a estabelecer uma comparação entre esse órgão europeu e o IBGE, haja vista ser a
geografia um ingrediente indispensável para o segundo. Um acúmulo de dificuldades pelas
quais passa o IBGE incide diretamente na sua autonomia técnica e financeira, condição necessária ao livre exercício das suas funções. Em nível mais abrangente, se o órgão nacional responsável pela produção de dados e informações que traduzem o Brasil como ele realmente é não goza de plenos poderes e condições ao cumprimento de seus deveres, pensamos que logo estaremos diante de um comprometimento da soberania nacional. Com base no panorama apresentado, a presente pesquisa objetiva analisar a produção de dados e informações oficiais do Brasil pelo IBGE enquanto prática reveladora do espaço geográfico em um contexto adverso de uma psicosfera e de uma tecnosfera do século XXI. Para viabilizá-la, utilizamos como meios procedimentais de natureza teórica e metodológica os levantamentos bibliográficos em diferentes estágios dessa investigação, a pesquisa documental e a realização de entrevistas, especialmente na etapa comparativa entre o IBGE e o INE.