Ecologia acústica de pares fêmea-filhote de baleia franca austral (Eubalaena australis) (Desmoulins, 1822) em águas costeiras do estado de Santa Catarina, Brasil.
Comportamento vocal, repertório acústico, ecologia comportamental, baleia franca do Atlântico Sul, par mãe-filhote.
O monitoramento acústico passivo (MAP) permite a convergência de soluções para questões conservacionistas e científicas e vêm sendo utilizado com sucesso para a examinar diversos aspectos da biologia de cetáceos. Todavia, sua aplicação para ambos os fins depende da correta interpretação dos dados coletados e portanto de conhecimentos prévios sobre o comportamento e o repertório acústico da(s) espécie(s) alvo(s). O sul do Brasil é uma importante área de reprodução para baleias francas austrais (Eubalaena australis). Esta espécie ameaçada agrega-se anualmente entre Julho e Novembro principalmente no estado de Santa Catarina. Medidas de proteção são necessárias para assegurar a recuperação e para mitigar os efeitos de atividades antrópicas sobre esta população. Visando construir conhecimento necessário para implementação de MAP como ferramenta de pesquisa e conservação da baleia franca no Brasil, o objetivo deste trabalho é reunir informações sobre a ecologia acústica de pares-mãe filhote da espécie. Sensores autônomos foram instalados em duas localidades na APA Baleia Franca e continuamente monitoraram o ambiente e vocalizações de baleias francas. 1427 chamados com SNR > 10dB foram classificados em 7 categorias: upcall (55.8%), downcall (12.9%), v-call (12.3%), tonal constante (10.1%), tonal variável (6.7%), híbrido (1.6%), pulsado (0.6%). A frequência de pico média de todas as vocalizações foi 107.5±35.2 Hz e a duração média foi de 0.8± 0.7s. A análise do padrão nictemeral do comportamento vocal mostrou que o raking médio das taxas ajustadas de vocalização em cada período (amanhecer, dia, noite e anoitecer) não variam significativamente (Kruskal-Wallis x2=5.86, df=3, p=0.12). Provavelmente, estes resultados estão relacionados a ontogenia comportamental dos pares e refletem a relação espacial entre mães e seus respectivos filhotes no período final de permanência na área de invernagem. Gravações realizadas com um arranjo linear de hidrofones sincronicamente a observações comportamentais, revelaram que a taxa de emissão de chamados está relacionada ao nível de atividade em cada estado comportamental. Em estados de maior atividade, como durante interações entre pares e entre mães e seus filhotes, a taxa de emissão de chamados foi respectivamente 3.35 e 0.21 chamados/minuto. Por outro lado, enquanto se deslocando ou em descanso, a taxa de vocalização foi de 0.12 e 0.02 chamados/minuto. Nenhuma vocalização foi atribuída aos pares focais em mergulho ou amamentando. Os testes exato de Fisher (F=14.82; p=0.21) e chi-quadrado (x2=19.06; df=15; p=0.37) revelaram que a associação entre os tipos de chamados e os estados comportamentais não é significativa. Porém classes de chamados distintas foram emitidas em proporções diferentes em cada estado comportamental. O significado funcional das classes de vocalização no contexto da comunicação de pares fêmea-filhote é semelhante a aquele descrito em estudos prévios, realizados com outros tipos de grupo da espécie. A composição de informações gerada por este trabalho constitui as bases do conhecimento acerca da bioacústica da baleia franca no Brasil e serão fundamentais para a implementação de ferramentas de monitoramento e preservação baseadas em princípios acústicos. Além disso, representam um importante passo para a expansão do conhecimento do comportamento vocal de pares mão-filhote, um subgrupo vulnerável porém vital para as populações.