INTERFERINDO COM OSCILAÇÕES DE ALTA FREQUÊNCIA NO HIPOCAMPO EPILÉPTICO: CONSEQUÊNCIAS PARA DAS CRISES ESPONTÂNEAS
Epilepsia do lobo temporal, modelos animais, oscilações de alta frequência, estimulação intracerebral, hipocampo.
Crises epilépticas são desordens paroxísticas do sistema nervoso central (SNC) caracterizadas por uma descarga elétrica neuronal anormal, com ou sem perda de consciência e com sintomas clínicos variados. Nas epilepsias do lobo temporal as crises tem início focal, em estruturas do sistema límbico. Dados clínicos e experimentais mostram que essas regiões apresentam morte neuronal (esclerose hipocampal), reorganização sináptica (brotamento aberrante das fibras musgosas) e gliose reativa, sendo esses marcadores biológicos da zona epileptogênica. Registros extracelulares mostram que além das alterações anatômicas mencionadas acima, a zona epileptogênica também apresenta oscilações de alta frequência patológicas (pOAF). As pOAF são oscilações transientes (50 – 100 ms de duração), de baixa amplitude (200 µV - 1.5 mV) e de frequências variáveis (80 – 800 Hz). A relação entre essas oscilações e a gênese das crises espontâneas ainda é desconhecida. O objetivo do presente trabalho foi avaliar os efeitos da estimulação elétrica intracerebral (EIC) nas pOAF e frequência de crises espontâneas de animais cronicamente epilépticos (modelo da epilepsia do lobo temporal). Atualmente, a EIC é utilizada no tratamento de distúrbios do movimento (e.g., mal de Parkinson) e em alguns casos de dor crônica, e experimentalmente, no tratamento das epilepsias de difícil controle. A hipótese de trabalho dessa dissertação é de que a indução de depressão de longa duração por EIC, ao reduzir a excitabilidade neuronal local, modulará as pOAF, bem como a frequência de crises espontâneas. Para isso, comparamos as características espectrais das pOAF e a frequência de crises espontâneas antes e depois de um protocolo de 12 horas de estimulação elétrica de baixa frequência (0,2 Hz) aplicado na via perforante. De fato, esse protocolo reduziu a amplitude do potencial de ação coletivo registrado no giro denteado (GD) do hipocampo dorsal em 45% (amplitude média da primeira e da última hora de estimulação: 7,3 ± 3,0 mV e 4,1 ± 1,5 mV, respectivamente; p<0,05; teste T). O monitoramento contínuo do potencial de campo local, realizado no GD e em CA3 simultaneamente, mostrou que o protocolo de estimulação empregado foi eficaz em (i) aumentar a duração (64,6 ± 9,3 ms vs. 70,5 ± 11,5 ms) e reduzir (ii) a entropia (3,72 ± 0,28 vs. 3,58 ± 0,30), (iii) o índice pOAF (0,20 ± 0,08 vs. 0,15 ± 0,07) e (iv) o modo espectral (237,5 ± 15,8 Hz vs. 228,7 ± 15,2 Hz) das pOAF (valores do GD, expressos como média ± desvio-padrão, para os períodos “pré” e “pós” estimulação respectivamente; p<0,05; teste T). Ainda, este protocolo reduziu significativamente a frequência de crises espontâneas (1,8 ± 0,4 vs. 1,0 ± 0,3 crises/hora; “pré” e “pós” estimulação, respectivamente; p<0,05; teste T). Curiosamente, observamos um aumento na duração média das crises espontâneas após o término do protocolo (39,7 ± 6,0 vs. 51,6 ± 12,5 s; “pré” e “pós” estimulação respectivamente; p<0,05; teste T). Estes resultados sugerem que a redução da excitabilidade neuronal, por meio de protocolos de estimulação elétrica, reorganiza o perfil espectral das pOAF. Esse efeito foi acompanhado de redução na frequência de crises espontâneas. Apesar de preliminar, o presente trabalho contribui para o desenvolvimento de terapias baseadas em EIC para as epilepsias.