CRUZETA CONTRA A REVOLUÇÃO: festa, poder e religião numa comunidade rural potiguar (1957-1964)
Renovação paroquial – política – pastoral rural
Entre as décadas de 1950 e 60, a Igreja Católica brasileira passou por um processo de renovação e atualização institucional, estimulado por fatores endógenos e externos, ligados à especificidade da conjuntura sóciopolítica e econômica do período, que afetou profundamente suas instituições eclesiais e seus modelos pastorais. Esse processo de atualização institucional vivenciado no plano mais global como resposta aos dilemas colocados pelo mundo contemporâneo, que ficaria conhecido por aggiornamento, adquiriu traços particulares à medida que foi sendo implementado nos mais variados lugares. Em Cruzeta, paróquia pertencente a Diocese de Caicó, província eclesiástica do Rio Grande do Norte, coube a figura do padre Ernesto da Silva Espínola (1928- 2011), o papel pioneiro nesse processo de renovação. Insuflado por esse novo espírito eclesiástico, ele seria responsável de implementar várias práticas de inovação pastoral que intensificaria a atuação da Igreja junto à comunidade local, especialmente entre os jovens e os trabalhadores rurais, no sentido de promover a unidade da Igreja, agora concebida mais como povo de Deus do que como hierarquia e clero. Suas ações no âmbito da pastoral rural que faria da paróquia de Cruzeta uma das mais progressistas da Diocese de Caicó, marcariam o advento da Igreja moderna na localidade. Dentre as iniciativas implementadas pelo vigário Ernesto na comunidade local, merecem destaque a implantação da Juventude Agrária Católica (JAC), em 1959, da realização da primeira Festa da Colheita (1961), da Educação Popular, através das Escolas Radiofônicas do MEB (Movimento de Educação de Base) e do sindicalismo rural. São essas ações pastorais desenvolvidas no âmbito social da paróquia pelo vigário Ernesto em parceria com o laicato católico em prol de um projeto cristão de comunidade defendido pela Igreja como “alternativa contemporânea” a um projeto de transformação mais radical e virulento da ordem social propagada pelas ideologias de esquerda, que tencionamos investigar mais de perto nesse estudo.