O CRONOTOPO DO BANQUETE EM SADE: O RENASCIMENTO DO GROTESCO
banquete; carnavalização; cronotopo; grotesco; romance.
Donatien Alphonse François de Sade, mais conhecido como Marquês de Sade, viveu entre os séculos XVIII e XIX na França e, a despeito de seus títulos, tornou-se famoso por sua radical sexualidade libertina praticada e exponencialmente representada em suas obras, que incluem romances, contos, peças de teatro, diálogos e tratados políticos, não obstante as históricas repulsas e proibições que sofreram as suas publicações, até momentos bem próximos a nós. Suas imagens literárias foram confundidas com sua própria realidade, além de apontadas como incentivadoras da perversão, o que, para muitas especialistas, levou ao equívoco de seu nome ser associado a uma tipificação psiquiátrica, caracterizada pelos termos sádico e sadismo. A partir daí, em um diálogo estabelecido por um intervalo de quase três séculos, entre o contexto de Sade, século XVIII, e o de François Rabelais, século XVI, os estudos teóricos fundamentais de Bakhtin (1989; 1998a; 2010a; 2010b; 2018a; 2018b; 2022) e Volóchinov (2018; 2019), com o apoio de obras de uma das maiores especialistas em Sade, a saber, Moraes (2006; 2013; 2015; 2017; 2021), foram cruciais para estabelecerem um diálogo entre o texto de Sade (1785), Les 120 journées de Sodome ou L’École du Libertinage, e o das obras completas de Rabelais (1861), Ouvres de F. Rabelais, sendo estas duas últimas as obras que compõem o nosso corpus. Os estudos teórico-literários bakhtinianos sobre o cronotopo orientaram nossa atividade analítica com a percepção de um elemento comum e criativo nas obras do corpus: o cronotopo do banquete. Dessa forma, analisamos sob diversas lentes a referida categoria para, em nossa investigação, perceber as contiguidades composicionais entre os referidos textos sob o aspecto das transformações, manutenções e/ou ausências de elementos desse mesmo cronotopo, guiado em um diálogo sob uma axiologia carnavalesca e grotesca como, por exemplo, os fatores da hiperbolização e a hibridização na composição em consonância com essa axiologia própria. Nesse processo, foram selecionadas passagens que reforçassem a hipótese da contiguidade composicional entre as obras do corpus. Assim, o cronotopo rabelaisiano foi a categoria analítica mais especializada para o alcance da possibilidade de estabelecer, ou não, um diálogo composicional entre Sade e Rabelais.