USO DE TRANSPLANTE DE ASTRÓCITOS NA REDUÇÃO DA EPILEPTOGENICIDADE EXPERIMENTAL
epilepsia do lobo temporal, terapia celular, astrócitos, crises espontâneas e recorrentes, espículas interictais
Os astrócitos, células especializadas da glia, estão envolvidos na homeostase extracelular por tamponar a concentração do cátion potássio (K+) , metabolizar neurotransmissores, controlar o disparo e a sincronização neuronal e contribuir para a formação da barreira hematoencefálica. Em condições patológicas, os astrócitos podem alterar a sua morfologia e passam a ser referidos como astrócitos reativos (gliose reativa). Este fenômeno é comumente observado em regiões cerebrais associadas à geração e propagação de crises epileptogênicas, entretanto, o seu papel na sincronização anormal é pouco descrito. Enquanto os astrócitos podem aumentar o metabolismo do potássio e do glutamato, a reativação prolongada pode levar à disfunção neuronal. A epilepsia do lobo temporal (ELT) uma das formas mais comum de epilepsia, usualmente é associada à refratariedade ao tratamento farmacológico. É caracterizada por morte neuronal (esclerose do hipocampo), reorganização sináptica (brotamento aberrante de fibras musgosas) e gliose reativa. Aqui, nossa hipótese é que o transplante de astrócitos imaturos no hipocampo de animais cronicamente epiléticos reduzirá a atividade epileptiforme, incluindo a ocorrência de crises espontâneas eletrográficas e comportamentais e a frequência de espículas interictais. Para isso, os animais foram feitos epilépticos pela injeção sistêmica da pilocarpina (que induziu o estado epiléptico, SE) e foram transplantados unilateralmente no hipocampo com astrócitos que expressavam a proteína fluorescente verde (GFP) 30 dias após a SE. A separação dos animais por grupo (SE-Salina e SE-Astro GD) foi feita de acordo com a severidade comportamental do SE. Atividades epileptiformes espontâneas (espículas interictais, oscilações de alta frequência e crises recorrentes) foram registradas em ambos os hipocampos (tratado e não tratado) usando eletrodos cronicamente implantados. A sobrevivência dos astrócitos foi de 0,8% (±0,21) e foram encontrados no hipocampo por até sete meses após o transplante. Células ou grupos de tecidos indicativos de tumor não foram identificados. Os astrócitos migraram aproximadamente 1500µm do sítio de injeção e foram localizados principalmente no hilo, na camada granular do giro dentado e na camada molecular do hipocampo. Em um segundo grupo, os astrócitos foram encontrados no córtex e constituiu o grupo SE-Astro Córtex. Não encontramos diferença quanto às atividades epileptiformes registradas entre os grupos. As crises espontâneas e as espículas interictais foram encontradas em 80% dos animais controle (SE-Salina, N = 8/10), em 80% dos animais com astrócitos localizados córtex (SE-Astro Córtex, N = 4/5) e em 60% dos animais com astrócitos localizados no hipocampo (SE-Astro GD, N=2/5). A ocorrência de crises espontâneas foi variável entre os animais (21 vs 12 vs 1 crises espontâneas registradas nos grupos SE-Salina, SE-Astro Córtex e SE-Astro GD, respectivamente) e não houve diferença na frequência de crises por horas (crises/hora: 0,05 ± 0,01 vs 0,03 ± 0,003 vs 0,02, SE-Salina, SE-Astro Córtex e SE-Astro GD, respectivamente). O transplante dos astrócitos não alterou a duração das crises espontâneas (67,5 ± 3,6 s vs 74,2 ± 3,9 s vs 65,3 para SE-Salina, SE-Astro Córtex e SE-Astro GD, respectivamente). Adicionalmente, não verificamos diferença na morfologia, periodicidade ou frequência das espículas interictais do hipocampo entre os grupos experimentais e/ou entre os hemisférios tratados. Em contraste para os animais do grupo SE-Salina, os animais do grupo SE-Astro Córtex apresentaram crises comportamentais mais brandas (Escala livre: 5 ± 0,6 vs 4 ± 0,4 SE-Salina e SE-Astro Córtex, respectivamente, p =0,02, teste de Mann-Whitney). Os animais do grupo SE-Astro GD só apresentaram uma crise espontânea, severidade 6. Nossos resultados enfatizam o uso da terapia celular para o tratamento das epilepsias e reforçam a importância do sítio do transplante para a redução da atividade epileptiforme.