Variações da linha de costa nos deltas do nordeste brasileiro e seus processos causadores
Sensoriamento Remoto; Deltas do nordeste brasileiro; erosão costeira; barragens; deltas naturais; deltas antropizados.
Os deltas desempenham um papel fundamental no desenvolvimento global, contribuindo para a produção de alimentos, rotas comerciais e geração de energia. No entanto, intervenções humanas na bacia de drenagem e no litoral os tornaram suscetíveis à erosão costeira. Este estudo investiga as alterações na linha de costa em três deltas do nordeste brasileiro (São Francisco, Parnaíba e Jequitinhonha) entre a década de 1980 e 2021, correlacionando-as com os impactos naturais e os induzidos pelo homem. Imagens multiespectrais foram utilizadas para avaliar mudanças horizontais na linha costeira por meio do software DSAS, fornecendo informações sobre tendências de longo prazo ao longo de diferentes décadas. Adicionalmente, foram analisadas variações na área costeira ativa para os mesmos períodos. Além disso, para o delta do São Francisco, os bancos de areia a jusante da barragem de Xingó foram delineados por meio de imagens de satélite. Dados hidroclimáticos de estações próximas à zona costeira também foram incorporados ao estudo.
Os dados revelam que o Delta do Parnaíba apresentou uma taxa de progradação em sua foz ultrapassando 20 m/ano, resultando em ganhos sedimentares de 6 km² ao longo do delta, sendo 2,2 km² na sua foz. O período de maior progradação ocorreu entre 1991 e 2005, coincidindo com o aumento da pluviosidade e os picos fluviométricos no baixo curso do rio. Em contrapartida, o delta do Jequitinhonha experimentou processos erosivos predominantes na foz, caracterizados por taxas abaixo de 10 m/ano e um aumento do ângulo de protrusão da foz do delta de 12° de 2005 a 2021. A correlação limitada da área costeira ativa (R² = 0,49) sugere que os sedimentos erodidos na foz são transportados, por meio de correntes bidirecionais, para as margens do delta.
Entre os três deltas, o delta do São Francisco apresentou uma erosão pronunciada na foz, com perdas superiores a 20 m/ano, chegando a até 50 m/ano. O ângulo da foz aumentou 13° no período analisado, e houve uma perda líquida de 6,2 km², sendo 2,6 km² na desembocadura.
Devido à escassa densidade populacional no litoral, a construção de barragens próximas ao litoral emergiu como um fator significativo que contribui para os processos de erosão nos deltas do Jequitinhonha e do São Francisco. Antes da construção das barragens de Itapebi e Xingó, ambos os deltas apresentavam relativa estabilidade em seus litorais. No entanto, os dados do Net Shoreline Movement (NSM) pós-construção da barragem indicaram um aumento gradual da erosão nas fozes ao longo do tempo. Além disso, essas estruturas potencialmente retiveram sedimentos a montante das barragens, reduzindo assim a variabilidade anual e mensal dos cursos inferiores dos rios Jequitinhonha e São Francisco, resultando em uma capacidade diminuída de erosão das margens e transporte de sedimentos para a área costeira. Por exemplo, no delta do São Francisco, entre 1984 e 2021, houve uma redução de 7,54 km² nos bancos arenosos a jusante da barragem de Xingó. Este número excede três vezes a perda de área costeira ativa observada em todo o delta. Notadamente, este fenômeno não ocorreu no delta do Parnaíba, pois a barragem de Boa Esperança está situada a 600 km da zona costeira.
As mudanças climáticas, juntamente com potenciais atividades de mineração e dragagem, podem alterar ainda mais a estabilidade do Delta do Parnaíba e exacerbar os processos de erosão nos Deltas do Jequitinhonha e do São Francisco. Nas últimas duas décadas, o Nordeste do Brasil experimentou uma redução de mais de 30% nas chuvas. Os dados do IPCC sugerem uma redução prevista de 60 a 70% nas chuvas nesta região até 2100. Consequentemente, espera-se que a capacidade de transporte fluvial diminua significativamente, intensificando assim os processos de erosão em ambos os deltas